Hoje foi Dia de Portugal. E a comemoração desta data é capaz de dizer muito sobre nós.
Desde logo a própria data que é absolutamente irrelevante do ponto de vista da nacionalidade. Portugal não nasceu em nenhum dia 10 de Junho de ano nenhum da graça de nosso Senhor.
10 de Junho é na realidade a data da morte de Camões. É um facto indesmentível que esse grande poeta foi dos que melhor nos soube interpretar. Mas em grande parte a sua influência póstuma mais nos condiciona do que nos recorda, e por isso a sua obra mantém uma gritante actualidade.
Não celebramos a vida de Camões, até porque basicamente o ignorámos em vida. Celebramos a sua morte porque é essa a única forma que conhecemos para homenagear quem quer que seja num pais em que o destaque dos vivos é geralmente mal reconhecido pela generalidade dos outros vivos portugueses. Pelo menos os mortos não se criticam uns aos outros.
O simples facto de ser Filipe II Espanha (I de Portugal) que reabilita a imagem de Camões após a chegada a Lisboa, quando pretendendo conhecer o poeta, descobre que já tinha falecido e estava enterrado numa qualquer vala comum, torna estranha a ideia de ter como dia nacional a celebração da morte de um homem que não conseguimos respeitar.
É a vida, dirão alguns, e por estas bandas a vida sempre foi madrasta para muitos.
Mas a ausência de qualquer festejo verdadeiramente popular, a ausência de símbolos, como o cravo de Abril, a não ser a própria bandeira nacional e as armas de Portugal (que não dão muito jeito para transportar se não for para a bola), leva a crer que a ideia de nação não está claramente enraizada em nós.
Não gosto de alimentar a ideia que somos uma sucessiva consequência de incidentes, uns mais felizes e outros mais infelizes, mas a realidade (por mais que nos custe) é que em praticamente nenhum momento da história portuguesa desempenhámos um papel colectivo enquanto povo, na defesa do interesse nacional. Antes, fomos quase sempre egoístas sobre as nossas pequenas mesquinhezes, sobre as terras, os negócios de família, mais tarde o comercio nas colónias etc. Tudo sobre aquilo que nos afectava directamente nos nossos locais de origem e nunca numa perspectiva nacional. Exemplos disso são a perda da independência, a restauração da mesma e até o 25 de Abril.
O país sempre foi dirigido por meia dúzia de iluminados, pertencentes a elites culturais que como no séc. XVIII, mais se identificavam com a França do que com o povo ranhoso que vivia aos seus pés e servia nas suas casas. Mas também sempre foi fortemente influenciado pelos endinheirados borregos que não tendo qualquer referência cultural faziam valer o peso dos seus anafados corpos e da sua anafada carteira.
Ao longo da história este desinteresse generalizado no futuro do país, enquanto entidade em que nos poderíamos rever com orgulho, foi habilmente aproveitado por elementos das elites que se iam revezando em orgias sanguinárias nos finais de cada ciclo político.
Habilmente conseguiram interpretar esta necessidade urgente dos homens providenciais, porque todos estávamos demasiado ocupados com o nosso quintal do que com o país.
Ainda somos assim. Ainda queremos homens providenciais, ainda queremos que tomem conta de nós. Ainda somos governados por elites que gostam mais do estrangeiro do que de nós, ainda somos ranhosos, o dinheiro ainda se sobrepões à justiça, e parecemos relativamente contentes com isso.
O país continua mesmo a ser o país de brandos costumes. Não se passa nada de particularmente importante neste país que nos faça levantar da cadeira, não haja o risco dela cairmos.
Já foi há muito tempo, e por isso a classe politica parece mais interessada em comemorar Abril e a Republica (não, não estou a criticar), mas o verdadeiro feriado nacional deveria ser a de 5 de Outubro, que marca o tratado de Zamora em 1143 que deu origem a este país. Mas infelizmente essa data já está ocupada.
Falta muito para cumprir Portugal, mas não quero parecer pessimista. Tudo isto tem algo de bom. Não nos levamos demasiado a sério como país e isso só nos pode ajudar. Levar tudo demasiado a peito só nos pode tornar iguais aos demais e nos fará perder em comparação e em dimensão. Temos a nossa própria especificidade, e apesar de continuarmos a ser um povo triste, já começámos a aprender a rir de nós próprios.
Fico contente que não nos tenhamos de levantar ao som do hino nacional e com o hastear da bandeira nas nossas escolas. Gosto de ter a possibilidade de não gostar de nós nem de Portugal. Mas um pouco mais de empenhamento não nos faria mal.
Desde logo a própria data que é absolutamente irrelevante do ponto de vista da nacionalidade. Portugal não nasceu em nenhum dia 10 de Junho de ano nenhum da graça de nosso Senhor.
10 de Junho é na realidade a data da morte de Camões. É um facto indesmentível que esse grande poeta foi dos que melhor nos soube interpretar. Mas em grande parte a sua influência póstuma mais nos condiciona do que nos recorda, e por isso a sua obra mantém uma gritante actualidade.
Não celebramos a vida de Camões, até porque basicamente o ignorámos em vida. Celebramos a sua morte porque é essa a única forma que conhecemos para homenagear quem quer que seja num pais em que o destaque dos vivos é geralmente mal reconhecido pela generalidade dos outros vivos portugueses. Pelo menos os mortos não se criticam uns aos outros.
O simples facto de ser Filipe II Espanha (I de Portugal) que reabilita a imagem de Camões após a chegada a Lisboa, quando pretendendo conhecer o poeta, descobre que já tinha falecido e estava enterrado numa qualquer vala comum, torna estranha a ideia de ter como dia nacional a celebração da morte de um homem que não conseguimos respeitar.
É a vida, dirão alguns, e por estas bandas a vida sempre foi madrasta para muitos.
Mas a ausência de qualquer festejo verdadeiramente popular, a ausência de símbolos, como o cravo de Abril, a não ser a própria bandeira nacional e as armas de Portugal (que não dão muito jeito para transportar se não for para a bola), leva a crer que a ideia de nação não está claramente enraizada em nós.
Não gosto de alimentar a ideia que somos uma sucessiva consequência de incidentes, uns mais felizes e outros mais infelizes, mas a realidade (por mais que nos custe) é que em praticamente nenhum momento da história portuguesa desempenhámos um papel colectivo enquanto povo, na defesa do interesse nacional. Antes, fomos quase sempre egoístas sobre as nossas pequenas mesquinhezes, sobre as terras, os negócios de família, mais tarde o comercio nas colónias etc. Tudo sobre aquilo que nos afectava directamente nos nossos locais de origem e nunca numa perspectiva nacional. Exemplos disso são a perda da independência, a restauração da mesma e até o 25 de Abril.
O país sempre foi dirigido por meia dúzia de iluminados, pertencentes a elites culturais que como no séc. XVIII, mais se identificavam com a França do que com o povo ranhoso que vivia aos seus pés e servia nas suas casas. Mas também sempre foi fortemente influenciado pelos endinheirados borregos que não tendo qualquer referência cultural faziam valer o peso dos seus anafados corpos e da sua anafada carteira.
Ao longo da história este desinteresse generalizado no futuro do país, enquanto entidade em que nos poderíamos rever com orgulho, foi habilmente aproveitado por elementos das elites que se iam revezando em orgias sanguinárias nos finais de cada ciclo político.
Habilmente conseguiram interpretar esta necessidade urgente dos homens providenciais, porque todos estávamos demasiado ocupados com o nosso quintal do que com o país.
Ainda somos assim. Ainda queremos homens providenciais, ainda queremos que tomem conta de nós. Ainda somos governados por elites que gostam mais do estrangeiro do que de nós, ainda somos ranhosos, o dinheiro ainda se sobrepões à justiça, e parecemos relativamente contentes com isso.
O país continua mesmo a ser o país de brandos costumes. Não se passa nada de particularmente importante neste país que nos faça levantar da cadeira, não haja o risco dela cairmos.
Já foi há muito tempo, e por isso a classe politica parece mais interessada em comemorar Abril e a Republica (não, não estou a criticar), mas o verdadeiro feriado nacional deveria ser a de 5 de Outubro, que marca o tratado de Zamora em 1143 que deu origem a este país. Mas infelizmente essa data já está ocupada.
Falta muito para cumprir Portugal, mas não quero parecer pessimista. Tudo isto tem algo de bom. Não nos levamos demasiado a sério como país e isso só nos pode ajudar. Levar tudo demasiado a peito só nos pode tornar iguais aos demais e nos fará perder em comparação e em dimensão. Temos a nossa própria especificidade, e apesar de continuarmos a ser um povo triste, já começámos a aprender a rir de nós próprios.
Fico contente que não nos tenhamos de levantar ao som do hino nacional e com o hastear da bandeira nas nossas escolas. Gosto de ter a possibilidade de não gostar de nós nem de Portugal. Mas um pouco mais de empenhamento não nos faria mal.
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