terça-feira, fevereiro 21, 2006

Amor e uma cabana

Brokeback Mountain é sobre o sonho que existe em todos nós da vida simples em contacto com a natureza, junto da pessoa que amamos. Mas como a maior parte dos sonhos de amor raramente as condicionantes da pressão social nos deixam seguir incondicionalmente as nossas paixões.

Para estes dois homens arrumados numa América rural prestes a deixar de o ser pela chegada de uma ruralidade corporativa descaracterizada, uma América que se extingue aos poucos em que o papel social predominante pertence a um núcleo familiar onde a existência de filhos é fundamental à manutenção do sistema e à sucessão do único bem passível de ser herdado - a terra, este era um amor impossível à partida.

Mas o amor é muitas vezes surpreendentemente mais forte do que aqueles que o vivem alguma vez pensaram e Ennis e Jack limitaram-se a seguir um instinto que de certa forma não entendiam mas que sabiam fazia sentido enquanto isso apenas os envolve-se aos dois, num segredo impossível de manter mas de uma simplicidade quase infantil.

Seguiram caminhos diferentes, os anos passaram e como quase sempre ficou a mágoa do que o passado poderia ter sido se tivessem escolhido outros caminhos para seguir. Caminhos diferentes, casamentos diferentes, futuros diferentes que um simples postal volta a juntar num reencontro que marcará definitivamente o rumo de cada um, assim como um simples postal traçará o fim deste amor.

Dois homens que tiveram a coragem de assumir responsabilidades diferentes nesta espécie de amizade colorida que durou mais de vinte anos sem que nenhum tenha dados os passos necessários à construção da cabana. Um que não resistiu a acabar o casamento com que sempre sonhou mas não teve a coragem de assumir um relacionamento com um homem, e outro que não resistiu a uma vida aqui e ali pontuada de promiscuidade mas que nunca teve a coragem de destruir o seu casamento de fachada.

Estes homens que faziam da montanha Brokeback a sua cabana não queriam nada mais que ter tido a coragem de ficarem juntos e isolados de um mundo que nunca os iria compreender. Tendo em conta a lógica irrefutável do amor que nos diz que duas pessoas que se amam devem ficar juntas, é triste perceber que mesmo que a descriminação não lhes tivesse matado o amor estes dois homens muito provavelmente nunca iriam ficar juntos.

3 comentários:

José Raposo disse...

Hoje não há tempo para mais. Mas devido a alguns protestos que me fizeram chegar alguns leitores mais tímidos, o que aqui se pretendia dizer com fim do amor é no sentido em que o amor termina quando deixa de haver objecto de amor... podemos passar aqui os próximos 3 séculos a falar se o amor resiste à morte, mas acho que não vale a pena :)

Nuno Guronsan disse...

Isso é que era uma discussão como deve de ser... se bem que não há tempo para tamanha façanha...

Nuno Guronsan disse...

Só para dizer que gostei muito da forma como descreveste aquilo que o filme mostra. E atrevo-me a dizer que quem já tenha passado por uma relação onde no final da mesma tenha ficado a pensa no "E se as coisas fossem diferentes?" deve mesmo ir ver o filme, esquecer tudo o que seja preconceito, e aperceber-se que sim, é a sua antiga relação que está ali a ser filmada. Pelo menos foi isso que eu senti...