sexta-feira, fevereiro 17, 2006

Guerra de Civilizações

Relativamente a um post feito pelo Ricardo (Filhodo25deabril) sobre as afirmações de Pacheco Pereira no programa A Quadratura do Circulo, deixo aqui em forma de post o comentário que por lá deixei.


Ricardo, eu acho que a resposta às tuas inquietações está mais ou menos na questão da falta de tolerância que temos e que têm em relação a nós outros povos. Eu tb não me sinto em guerra, mas sinto-me fortemente motivado a defender aquilo que me parece ser uma ameaça instrumentalizada pelos governos dos países muçulmanos, mas tb pelos nossos governos que ao se calarem vão alimentando um medo que lhes serve para melhor nos controlarem sob uma capa de protecção militar.

É realmente estranha a sucessão de acontecimentos que falas, e como subitamente um acontecimento retardado quatro meses se torna numa espécie de guerra de civilizações. Mas tb não será totalmente inocente o aparecimento de cada vez mais apologistas das limitações da liberdade de expressão ou imprensa baseados em conceitos mais ou menos obscuros de bom gosto ou de boa ou má imprensa.

Preocupa-me que o conceito de liberdade de imprensa não esteja consolidado ao ponto de acharmos detestável ou idiota o que os jornais escrevem sem lhes queremos limitar a possibilidade de escreverem disparates.

Tal como tu não partilho os mesmos valores com os muçulmanos e em muitos aspectos revejo muito poucos dos meus valores noutros ocidentais que tal como eu partilham a mesma herança cultural.

Pacheco Pereira é apenas mais um num universo da "comentarite" (a que nós tb pertencemos) e o impacto das suas palavras vale pela credibilidade que lhe quisermos dar.

Eu tb acho que existe um choque de civilizações evidente e que mais tarde ou mais cedo vai acabar por ter de se resolver, mas não alinho no grupo daqueles que defende a guerra ou a violência como forma de resolver o problema e que insistem em querer arrastar novamente a Europa para a difícil situação de ter de decidir de que lado está da barricada.

A Europa tem um papel neste choque de civilizações e tem de ser a sua própria visão do problema e não a visão maniqueísta dos americanos.

No entanto as posições Europeias dos últimos tempos levam-me a crer que nos estamos a demitir da responsabilidade de ter uma posição firme.

6 comentários:

Ricardo disse...

Caro José,

Também coloco aqui o comentário que escrevi:

"O que é irónico é que a nossa liberdade de expressão e imprensa não está a ser limitada pelos tais "bárbaros"! Quem quiser estar atento sabe que quem nos está a retirar direitos e liberdades são os nossos representantes, escudados na defesa a estes mesmos "bárbaros". Mas aproveita-se a "desculpa" do terrorismo - que agora é civilizacional - para vigiar tudo e todos e, mais grave, para aprovar leis nacionalistas que limitam a nossa liberdade de criticar o próprio país. Afinal quem está a colocar em causa os nossos valores?

Quem é que ameaçou os nossos valores? Um grupo de extremistas que utilizou a violência como resposta a uns cartoons. E o resto? Manifestou-se pacificamente criticando as caricaturas (note-se que a liberdade de expressão dá-nos o direito a criticar até a liberdade de expressão e, no limite, criticar o mau gosto que advém da liberdade de expressão sem colocar esta em causa). Achas que se todo o Islão quisesse realmente limitar a Europa a violência teria tido estes níveis ou seriam completamente diferentes destes? Não convém confundir o Islão com os seus radicais da mesma forma como não quero ser confundido com os grupos radicais que operam em Portugal."

Obrigado pelo destaque. Abraço,

Anónimo disse...

Não está em causa limitar a possibilidade de escreverem (os jornais) disparates. Está e causa a usurpação que fizeram do direito de informar como sendo um direito que apenas a eles pertence e que prevalece, qual dogma sagrado, sobre todos os outros. É que existe uma fronteira entre o direito que lhes assiste de escreverem disparates que jamais poderá colidir como todos os meus direitos, os direitos de todos nós.
E é esta fronteira que abusivamente violam impunemente, escudados na vaca sagrada do direito à liberdade de escreverem e alguma cobardia de outros poderes instituídos.
Meu caro Raposo a Europa não tem a “difícil situação de ter de decidir de que lado está da barricada” A Europa é um dos lados da barricada, ela é a civilização Ocidental, e se neste momento a liderança desta barricada é assumida pelos EUA que a gerem a seu belo prazer a culpa apenas pertence á Europa.

Anónimo disse...

Considero-me um cidadão ocidental, mas jamais me considero do mesmo lado da "barricada" dos E.U.A.

Anónimo disse...

Gosto de muito de ser "tuga" (a sério, apesar de tudo!), considero-me um "cidadão do mundo" (se me permitem o plágio) e acho que anda gente a mais a erguer barricadas (onde elas existem e onde não, onde se as inventam)...

José Raposo disse...

Falta tempo para resposta, no entanto aqui vai.

Ricardo,

Concordo basicamente com o que dizes. Aliás é mesmo esse risco o que mais me preocupa. Preocupa-me que subitamente tenhamos de voltar a falar da liberdade de imprensa porque um grupo de pessoas se sentiu ofendido com o exercicio da nossa liberdade mas tb com a forma pouco clara como respondemos a essa situação, pelo menos em relação à forma como esses protestos se fizeram sentir.

Parece-me que depois de passar esta confusão vamos ver aparecer uma série dos nossos extremistas...

Ferraz,

não consigo entender como ao mesmo tempo defende uma posição firme sobre as caricaturas na melhor das tradições da civilização ocidental e depois considera uma usurpação do direito de informar o caso do Envelope 9 ou do 24 Horas.

Para mim a liberdade de escrever, ainda que disparates, é de facto uma vaca sagrada. O que se passa é falta de equilibrio porque outros grupos (nomeadamente os políticos) perderam influência na sociedade
porque se aproveitaram desta mesma comunicação social que agora não lhes serve e este espaço foi, naturalmente, ocupado por bom e mau jornalismo.

Tinha esperança que o Ferraz tivesse por termo de comparação a metáfora cavaquista da boa e da má moeda e que confiasse que a má imprensa acabaria por ser corrida pela boa imprensa.

Concordo que a culpa da liderança do mundo ocidental estar exclusivamente nas mãos dos americanos é culpa da Europa. No entanto não concordo que isso represente o mesmo lado da barricada. Eu não me sinto desse lado porque esse lado preconiza um tipo de violência semelhante àquele que se propôe combater.

Miguel,

Tal como disse aqui em cima, concordo que não estamos no mesmo lado.

Anónimo,

Cada vez mais me convenço que ser "tuga" mesmo com todos os defeitos é muito bom... poderia ser melhor, mas tb poderia ser bem pior.

Anónimo disse...

Deixa-me simplificar um pouco. Estar do mesmo lado da barricada? Mas tenho poucas hipóteses de escolha.
Tenho a economia de mercado que me é imposta, bebo a Cola com Mac que importo.
Tenho a política externa e a componente militar também importada, eu apenas tenho o direito de dizer que estou a favor ou conta. O que fazemos EUA
Tenho a cultura que importo, os livros que eles escrevem os filmes que fazem com as mensagens que querem passar.
Tenho os meus ídolos do desporto que importo e desejo ver nos olímpicos que os EUA tenham sempre mais medalhas.
Tenho a imprensa que tenho, importada com valores que o Times A Ofrah os 60 minutos, a CNN etc.
Tenho a educação que tenho, a légua da dos EUA e ate a declaração de Bolonha que por egoísmo nosso tarda em avançar, é uma tentativa de imitar os EUA para hipoteticamente podermos ter hipótese de um dia, enquanto Europa, conseguir igualar o desenvolvimento deles e obter os prémios Nobel que eles sistematicamente têm.
Quanto à má moeda do Cavaco e utilizando essa imagem isso seria verdade se hoje a comunicação social fosse de facto um pilar de democracia. Genuína, isenta e portadora de valores, romântica como no século XIX. Ilusão, ela é tão-somente um negócio empresarial onde eu apenas tenho uma pequena decisão. Comprar ou não comprar. Qualquer título de um jornal diário não transporta uma realidade vivida mas apenas o modo como o jornalista diz que a vê (sempre tendenciosa) esse título apenas transporta o markting necessário para que eu o compre. Tenta escrever um artigo bem fundamentado sobre um tema da tua realidade diária e procura publicado. Espera sentado. Limita-te a fazer este blog e vai discutindo com os visitantes que vão passando
Após a ida da PJ ao 24 horas tens visto muita solidariedade da classe jornalística ao 24 horas? Onde anda arrogância do 24 horas de à um mês e das parangonas contra Souto Moura? Liberdade de imprensa, é um valor que cultivamos mas nunca és tu quem decide o que se publica como se publica e contra quem se publica. Meu caro, não sou pessimista nem derrotista, adoro a liberdade para pensar e agir mas, definitivamente sou realista e não idealista. Este desabafo vai longo. Talvez estes dias, sobre esta temática, alinhe algumas ideias nos antropólogos. Penso que vale a pena discutirmos sobre tudo isto. JF