Na continuação das respostas ao questionário através d' O Eleito, e tal como anunciado, seguem as respostas de Jerónimo de Sousa.
Esta raríssima oportunidade de se colocar algumas questões aos candidatos e alguns deles acabarem por responder já justifica o esforço que muitos portugueses fazem para desenvolver esta espécie de foruns de discussão na internet.
Devido à dimensão das respostas inaugura-se o Terminal do Suburbano, onde poderão ver a totalidade das respostas (assim como n'O Eleito) que doravante servirá de back-up ao Suburbano.
Perguntas:
1. Quais são as expectativas para a evolução da democracia portuguesa nas próximas duas décadas?
2. Como poderá um cidadão apartidário intervir politicamente?
3. Qual o papel do estado no processo crescente de globalização?
4. Qual o valor estratégico da lusofonia?
5. O que poderá a UE esperar de nós?
6. Muitos têm vindo a dizer que é no financiamento dos partidos que a democracia portuguesa sofre uma maior erosão. Que mecanismos sugere para alterar este estado das coisas?
7. Considera necessária a regionalização? Em que moldes?
Respostas:
1 - Ao longo de praticamente três décadas, embora de forma mais ou menos intensa, com avanços e recuos, as políticas de direita levadas a cabo pelos diversos governos, laranja ou rosa, estiveram orientadas estrategicamente para a destruição de tudo quanto de essencial caracteriza a democracia portuguesa resultante da Revolução de Abril.
O resultado está à vista. O grande capital, logrando êxitos consideráveis contra as transformações democráticas – nos planos económico, social, cultural e político – alcançadas com Abril, restaurou grande parte do seu poder e acentuou a subordinação do poder político pelo poder económico.
Com as consequências esperadas. Atraso no desenvolvimento, estagnação económica, agravamento das condições sociais – cortes nas pensões sociais, meio milhão de desempregados, pobreza e exclusão social (quase dois milhões de portugueses, sobretudo idosos, vivem na pobreza).
A evolução do regime democrático e as perspectivas quanto ao seu futuro suscitam as maiores apreensões.
A evolução da democracia portuguesa nas próximas décadas passa por saber se é possível hoje, e se estão criadas as condições para travar e pôr cobro à ofensiva da direita dos interesses, efectivando uma verdadeira ruptura democrática e de esquerda com as políticas e as orientações que conduziram o país à situação de grande precariedade em que este se encontra.
Ou se, pelo contrário, vamos assistir ao afundamento ainda maior da nossa economia, à destruição do que resta do aparelho produtivo , à progressiva degradação da democracia política, com a limitação de direitos, liberdade e garantias dos cidadão, à sucessiva perda de fatias da própria soberania nacional.
Se não formos capazes de resistir e de travar esta ofensiva sem precedentes contra o Portugal de Abril, então, seguramente, teremos pela frente em Portugal um novo sistema socio-económico e um novo regime político, seguramente de cariz autoritário.
Sinal claro desses perigos são as constantes ameaças e sentenças, por parte dos apoiantes da candidatura de Cavaco Silva, contra a Constituição da República, visando não apenas desrespeitá-la mas eliminar-lhe todos os traços de Abril, e uma profunda alteração do próprio sistema político.
Defender e aprofundar o regime democrático, encontrar colectivamente um novo rumo e fazer renascer a esperança num Portugal verdadeiramente democrático e progressista é o imperativo que se coloca hoje a todos quantos não se revêem na actual situação do país.Na realidade, e em grande medida, joga-se nestas eleições presidenciais o nosso futuro colectivo.
2 - Entre os factores de degradação da democracia a que vimos assistindo com preocupação no nosso país, está o crescente alheamento dos cidadãos da vida cívica e política.
É já um lugar comum lamentar a falta de participação dos cidadãos na vida política, quer a propósito do aumento das taxas de abstenção eleitoral, quer pela falta de interesse dos cidadãos, quer pela desconfiança com que estes encaram a política e os políticos em geral.
Só que as soluções que os responsáveis pelos sucessivos governos apresentaram para alterar este estado de coisas, como é o caso da famigerada “reforma do sistema político”, contribuem ou podem contribuir para descaracterizar ainda mais a democracia portuguesa.Os que continuam a falar da participação dos cidadãos são os mesmos que dão exemplos escandalosos e que fazem da vida política uma sucessão de actos de falta de ética e de princípios, fazendo no governo exactamente o contrário do que propõem na oposição, como tem acontecido, alternadamente com os partidos que se sucedem no governo.
É necessário inverter este estado de coisas, por forma a assegurar uma verdadeira democracia participativa que, por um lado não se esgota nos partidos, certamente, mas que não pode nem deve confundir-se com o discurso contra os partidos, procurando fazer esquecer o que custou a liberdade de constituição de partidos políticos em Portugal.
Dentro ou fora dos partidos políticos, é absolutamente necessário incentivar a participação democrática, tornando-a uma prática quotidiana na tomada de decisões nos mais variados planos e áreas, seja ao nível da organização laboral nas empresas e sindicatos, seja na multifacetada área associativa, seja em sectores como o ambiente, saúde pública, património e qualidade de vida em geral.
É também muito importante que seja estimulado e garantido a todos, quer pessoalmente quer pela via associativa, o direito constitucional de iniciativa legislativa popular e o direito de acção popular.
3 - No contexto da globalização, a defesa dos povos e dos Estados nacionais, a defesa dos trabalhadores e da generalidade das camadas sociais de menores recursos económicos, passa inevitavelmente pelo reforço do papel do Estado. É por outro lado claro, que os interesses do capital transnacional, dos fundos financeiros e do grande capital nacional (aliás sempre intimamente articulados) se defendem com «menos Estado», segundo as boas receitas neoliberais. Eles hoje dispõem de um conjunto de organismos e organizações supranacionais (BM/FMI, OMC, OCDE, UE, BCE, etc.) que substituem, fazem melhor, no espaço económico planetário e/ou grandes espaços regionais, algumas das funções de defesa dos seus interesses, cometidas anteriormente aos Estados nacionais.
Os povos e os trabalhadores precisam de um maior papel do Estado nacional, em primeiro lugar, exactamente para, em cooperação com os outros Estados (soberanos e iguais em direitos), intervir na tentativa de influenciar e condicionar essa globalização, não a deixando entregue ao comando do capital transnacional e das suas organizações! Em segundo lugar, porque no contexto da globalização, com a redução (e mesmo a perda) do controlo dos fluxos económicos e financeiros através das suas fronteiras e de outros mecanismos que «abrigavam» e defendiam as suas economias de acções externas, os países precisam de compensar essas perdas com uma capacidade acrescida de intervenção (económica, social, política) do Estado, se querem defender os seus povos. E pode acrescentar-se, que o reforço dessa intervenção, necessitará de ser tanto maior, quanto mais pequeno, periférico e débil economicamente for o país, como sucede com Portugal. A abertura de fronteiras, a liberalização da circulação de capitais, a sujeição crescente da fixação das taxas aduaneiras a acordos internacionais, etc. exigem mais, e não menos, intervenção do Estado. Que por isso não podem abdicar de instrumentos como a política monetária e a política orçamental.
Quando Portugal abdicou da moeda nacional, e por essa via perdeu instrumentos como a fixação da taxa de cambio, da taxa de juro (entregues ao BCE), o controlo da circulação de capitais, e viu mesmo a política orçamental ficar sujeita ao espartilho do Pacto de Estabilidade, contrariamente às opiniões dos que defendiam a bondade para o País da moeda única, fragilizou a sua capacidade para enfrentar a globalização.
4 - A língua portuguesa é um valioso instrumento de comunicação e relacionamento. Pode por isso, no que a Portugal e ao povo português concretamente respeita, contribuir para facilitar a aproximação e o intercâmbio cultural e também económico e político-diplomático com Estados e povos que utilizem o português como língua oficial, respondendo ao imperativo estratégico de diversificação das relações externas do nosso país. O combate ao afunilamento das relações de Portugal para os EUA e União Européia é condição necessária ao desenvolvimento soberano e independente de Portugal.
Por outro lado a criação de um espaço de amizade e cooperação em pé de igualdade que uma língua oficial comum propicia pode ser mutuamente enriquecedor e favorecer a resistência à “nova ordem” que a globalização imperialista tenta impor ao mundo. O que exige uma correcta avaliação da história, com as suas luzes e as suas sombras, em que o “encontro de culturas” não pode fazer esquecer terríveis relações de exploração e dominação colonial. E a consciência de que quaisquer veleidades paternalistas e neocolonialistas (que estão a regressar em força às relações internacionais) tudo deitariam a perder.
5 - Esta U.E., que caracterizamos como um instrumento do grande capital e das grandes potências, só pode esperar a subserviência daqueles que querem levar até ao fim a destruição das realizações de Abril, e o combate daqueles que lutam por um Portugal independente e soberano e a realização da plataforma de progresso social e paz que a Constituição da República consagra. É esta a posição da minha candidatura que, se bate por uma outra Europa de progresso, paz e cooperação.
6 - O financiamento da nossa actividade partidária sempre foi transparente. No essencial o nosso Partido vive de receitas provenientes das quotas e contribuições dos seus militantes e do produto resultante de diferentes iniciativas.
Quando nós afirmamos ser contra a actual Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais é porque ela representa uma ingerência na vida interna dos partidos e tem como grande objectivo dar mais dinheiro do Estado aos grandes partidos, em particular ao PS e ao PSD, que hoje já vivem sobretudo à custa disso, e criar impossibilidades e dificuldades aos que, como o PCP, vivem sobretudo de receitas próprias conseguidas pelo esforço das suas organizações e militantes.
São exemplos disto, desde logo, o limite que a lei consagra à angariação de fundos provenientes de iniciativas especiais onde se inserem a Festa do “Avante!” e outras iniciativas político-culturais e as limitações impostas à forma de pagamento de quotizações.A posição do PCP é inequívoca quanto a estas matérias.
Em primeiro lugar defendemos que se deve deixar aos militantes dos partidos o direito soberano para decidirem como os seus partidos se devem financiar.
Em 2º lugar estamos em absoluto de acordo com a exigência para que todos os partidos apresentem contas claras e de todas as suas organizações e estruturas, o que desde sempre temos feito, mas sem intromissões e comandos exteriores que visem uma intromissão na vida partidária, por nós considerada inadmíssivel.
7 - Há quatro aspectos essenciais de que o País beneficiará com a implementação do processo de regionalização.
Em primeiro lugar a regionalização é um factor de democratização. Desta forma também o poder regional, a par do que já acontece a todos os níveis de poder, desde a freguesia aos orgãos de soberania, será legitimado pelo voto das populações.
Em segundo lugar, a regionalização é um instrumento que favorece a democracia participativa. O facto de existir uma aproximação dos serviços públicos às populações e a legitimação do poder através do voto popular constitui um estímulo à participação.
Em terceiro lugar, a regionalização pode favorecer o desenvolvimento. Pode não ser uma condição necessária nem suficiente do desenvolvimento, mas também é inquestionável que a existência de regiões e de um sistema democrático e representativo ao nível regional pode estimular os serviços públicos, contribuindo não só para a sua dinamização, como para a dinamização do investimento público. Além disso, tendo o desenvolvimento uma dimensão não apenas económica, mas também social, cultural e ambiental. o poder regional democrático e as suas actividades podem ser um factor benéfico e uma contribuição importante para o assegurar.
Por último, a regionalização é condição de uma reforma administrativa democrática, que dê coerência à administração periférica do Estado e permita descentralizar e desburocratizar.A Constituição da República define no capítulo IV artigo 255º, que as regiões administrativas são criadas simultaneamente, por Lei, a qual define os respectivos poderes, a composição, a competência e o funcionamento dos seus orgãos, podendo estabelecer diferenciações quanto ao regime aplicável a cada uma.
Assim, a instituição das regiões administrativas como autarquias locais, tal como estão previstas na Constituição, deve resultar de um processo de ampla consideração das suas áreas com base num largo debate público e na participação municipal. Um processo dinâmico que, com base num ponto de partida definido, que cria os instrumentos necessários para, através dos mecanismos de participação constitucionalmente estabelecidos, permitirá que se chegue a uma regionalização que corresponda a necessidades de desenvolvimento económico, cultural e social e às realidades existentes e seja querida pelas populações.
3 comentários:
O "Apeadeiro" (é mais de passagem e a paragem não é obrigatória) está interessante, embora para já, apenas com este conteúdo, pareça o apeadeiro do Barreiro, de Almada, da Marinha Grande, ou assim! Não fora a contagiante simpatia do Jerónimo, diria que isto soa um pouquito a cassete, não? Ainda que afinadinha e com razão em partes da letra...
Sim talvez seja um pouco cassete, ainda não tive tempo para ler tudo... mas como temos assistido até aqui os candidatos parecem não se querer comprometer com nada de especial... Nem mesmo aqueles que à partida não têm qualquer hipotese
De qualquer forma o "Apeadeiro" servirá no futuro exlusivamente para histórico aqui do blog principal.
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